A Bíblia ensina orar por pessoas mortas?



Resposta a um comentário no canal do YouTube

O vídeo sobre os motivos de não ser católico romano foi visto por pelo menos 570 pessoas até o momento em que recebi o comentário que vamos responder hoje. Porém, esta é a primeira vez que um estudante católico romano responde a um vídeo no nosso canal e por isso vou dar a atenção devida, conforme foi solicitada.

A resposta que precisamos trabalhar é esta:
"Você diz que não há base bíblica para a oração pelos fiéis defuntos. Portanto peço que você me explique 1Corintions(15,29), onde Paulo fala sobre os que se "batizam" em favor dos morros, ou seja daqueles que praticam penitência a favor dos mortos, e 2Timotio(1,16), onde Paulo está explicitamente orando por um fiel morto. Ainda sobre este segundo versículo cito o comentário do protestante SYDNEY CHARLES GAYFORD, que assim comenta o versículo em questão:

“...a explicação mais satisfatória é que Onesíforo estava morto... E assim podemos realizar com alguma confiança que temos nessa passagem a autoridade de um apóstolo em oração pelo bem-estar dos que partiram.” (The Future State, New York: Edwin S. Gorham, second edition, 1905, pp. 56-57)
Peço que me explique o amplo apoio da Tradição à esta prática. A Didaque, documento cristão contemporânea a escrita dos evangelhos, nós diz o seguinte:
“Ao fazerdes as vossas comemorações, reuni-vos, lede as Sagradas Escrituras… tanto em vossas assembléias quanto nos cemitérios. O pão duro que o pão tiver purificado e que a invocação tiver santificado, oferecei-o orando pelos mortos”.(Didaque)"

Antes de iniciar, quero indicar os nossos estudos sobre leitura e interpretação das Escrituras, visto que no comentário o autor parece não ter muita experiência com leitura bíblica, é possível que outras pessoas não tenham também. ACESSE CLICANDO AQUI.

A primeira coisa que quero lembrar é que, a tradição para o catolicismo é bastante importante para a interpretação bíblica e por isso muitas vezes a tradição supera a Bíblia, como no caso em que estamos vendo aqui. Para nós, porém, a tradição é sempre escrava da Bíblia. Se ela não estiver explicada nas Escrituras é descartada imediatamente, não importa de quem venha, ela não tem validade se a Bíblia não ensina assim. É o exemplo da tradicional “língua estranha”, do movimento pentecostal, ou do “segundo batismo”. Essas coisas não são ensinadas na Bíblia e quando lemos percebemos claramente ser diferentes, ainda assim, algumas pessoas importantes as apoiam como verdade, mas isso não nos faz ceder e as aceitar. Continuamos negando aquelas tradições que não são ensinadas na Bíblia.

Por isso, quando o autor do comentário cita pessoas interpretando os dois textos, a primeira coisa que fiz foi estudar o texto e rejeitar os comentários, pois eles estão bastante fora do contexto e da leitura simples e clara da Bíblia, além de não receber apoio algum em toda a Escritura.

A Didaquê

O autor do comentário citou a Didaquê (provavelmente o capítulo XIV) como apoio à ideia de que devemos orar aos mortos, porém, consultei algumas edições (incluindo uma da editora Paulus) e não há nada sobre isso nelas, aliás, nem mesmo a citação do autor “quanto nos cemitérios” foi encontrado em nenhuma das edições. Ainda que estivesse escrito na Didaquê “quanto nos cemitérios”, não seria suficiente para apoiar nenhuma das ideias do autor, uma vez que, vivendo em um período de perseguição é possível que tivessem necessidade de se reunir em um local assim. Se isso acontecia em cavernas, não acharia estranho que acontecesse em cemitérios também, porém, o texto não está falando que se reuniam ali para orar aos mortos. Apenas que se reuniam ali.

Aliás, é bastante interessante citar este importante documento, pois no capítulo VI ensina expressamente evitar “rigorosamente o que for oferecido a ídolos, pois isso implica adoração a deuses mortos” (Pais apostólicos, Ed. Mundo Cristão, p.126) – ora, não é exatamente isso que acontece nas festas à Maria? Sabemos da sua importância, porém, não há como negar que, assim como todo ser humano, ela tenha morrido e aguarda, assim como todos os cristãos a volta de Jesus para julgar este mundo e nos salvar definitivamente. Os católicos, porém, fazem festas a uma imagem feminina muito bem conhecida em outras religiões, mudando apenas o nome para que consigam enganar uns aos outros. Não passa, porém, de uma amostra da total depravação humana em relação à religião – vamos tocar nesse assunto posteriormente.

Outro trecho importante de A Didaquê, está no capítulo IX, onde trata da eucaristia da seguinte forma: “Vocês não podem permitir que alguém coma ou beba de sua eucaristia, exceto os batizados em nome do Senhor” (ibidem). Porém, dentro do catolicismo romano, apenas o padre está autorizado a “beber” o vinho, elemento da ceia do Senhor e os fiéis são proibidos de participar perfeitamente da ceia do Senhor. Desobedecendo assim, um dos documentos mais antigos da igreja cristã, além da instrução bíblica dada por intermédio do Espírito Santo a Paulo em 1Co 15.25.

Veja que até agora usamos a Didaquê contra o argumento citado no comentário. Não precisei distorcê-la, ou reinterpretar, pois está muito claro em todos os arquivos que analisei. Em nenhum deles encontrei o culto no cemitério, porém, ainda que exista uma edição com essa informação ela não serve como apoio à oração aos mortos, ou batismo pelos mortos. Isso me deixa aliviado na verdade, pois sei da importância desse documento para a nossa história. O autor do comentário, portanto, tentou usá-lo de maneira imprecisa ou até mesmo duvidosa a fim de apoiar uma ideia anticristã. Aconselho ficar com as Escrituras e abandonar esses costumes pagãos.

Paulo à Igreja em Corinto

O autor mencionou, a fim de apoiar suas ideias, o texto de Paulo em 1Co 15.29. A tradução católica “Bíblia do Peregrino” traduz o verso da seguinte maneira:
“Se não fosse assim, o que fazem os que se batizam pelos mortos? Se os mortos não ressuscitam, por que se batizam por eles?”.
A nossa tradução padrão (ACF) descreve assim: “Doutra maneira, que farão os que se batizam pelos mortos, se absolutamente os mortos não ressuscitam? Por que se batizam eles então pelos mortos?”

Veja, as duas traduções são muito próximas e descrevem algum tipo de costume em que uma pessoa se batiza por um falecido. Porém, Paulo está usando isso como exemplo a fim de apoiar a ideia da ressurreição. Não está ensinando que isso é praticado pelos cristãos. Ele deixa claro: “os que se batizam”. Ele não está falando sobre algo que os crentes faziam, mas a algum costume (estranho e ineficaz) praticado naquela época. A Bíblia do Peregrino traz um comentário sobre esse verso, segue:
“15,29. Acrescenta uma argumentação complementar. Não conhecemos exatamente o sentido dessa prática; alguns conjecturam que pagãos convertidos recebiam outro batismo em favor de parentes ou amigos não-cristãos mortos. O rito se parece com nossas intercessões e sufrágios (cf. 2Mc 12,39-42)” (Bíblia do Peregrino, Ed. Paulus – p. 2365).


Sufrágio, segundo o dicionário Oxford é: “rogo, por meio de oração ou obra pia, pela alma de um morto”. E para apoiar essa heresia o autor do comentário cita o texto em 2Mc 12.39-42. Fiz uma análise no texto, usando a própria tradução católica e não encontrei nada que ensine a orar pelos mortos também. Talvez a leitura errada do verso 42 possa ter gerado essa terrível tradição, que pode ser considerada satânica. Porém, o texto em Macabeus não ensina o que é praticado, antes demonstra que o povo orou para que Deus perdoasse os pecados deles, daqueles que foram poupados da sua ira.

Voltando ao texto de Paulo, precisamos ler todo o texto para não nos confundir. Por isso indico sempre que posso o estudo Leitura Imersiva da Bíblia, pois sei que com ele vocês não serão mais enganados por ensinos assim. Paulo está defendendo a doutrina da ressurreição e, como sempre, usa muitos exemplos comuns às doutrinas dos apóstolos, mas não se limita a isso. Paulo usa costumes comuns em outras religiões também. Faz isso para que sua mensagem seja facilmente compreendida por aqueles que a receberem. E nós fazemos isso o tempo todo também, mas ele não está validando um costume, está apenas citando para que seja fácil compreender o tema central do texto. Imagine que os próprios inimigos da fé, na época de Paulo, fizessem esse tipo de batismo e ainda assim não acreditassem na ressurreição. Como os gnósticos, por exemplo. Faz sentido usar isso como exemplo a fim de apoiar a doutrina correta (a ressurreição aqui).

O comentário na Bíblia do Peregrino informa corretamente que não conhecemos direito o costume citado pelo apóstolo. Isso é assim mesmo, pois não aprendemos na Bíblia este costume. Ele não é ensinado em parte alguma, nem mesmo citado como exemplo. Por isso não devemos chegar à conclusão de que é um costume comum no cristianismo, pois, não é ensinado em lugar algum e ainda é expressamente proibido no mandamento de Deus. No final falarei sobre isso.

O autor cristão, Kistemaker comenta muito bem sobre este texto, fazendo referências antigas, veja:
“Paulo trata agora da prática daquelas pessoas que estão sendo batizadas em benefício dos mortos. Ele confronta só aquelas poucas pessoas que observam essa prática, pois aqui ele usa o pronome eles, e não vocês. Presumimos que Paulo denunciava vigorosamente tais atos; não há evidência de que igrejas na era apostólica algum dia praticasse batismo em benefício dos mortos. No século 3º, Tertuliano comenta esses versículos e observa que Paulo desaprovava a prática do batismo em benefício dos mortos. Cem anos mais tarde, Crisóstomo descreveu um procedimento bizarro de alguns dissidentes marcionistas que batizavam uma pessoa que havia morrido repentinamente e que não era batizada. Ele também expressou sua desaprovação e até declarou supersticiosa a prática marcionista” – na página seguinte complementa: “A expressão batismo em benefício dos mortos é eco de uma expressão semelhante, “orar pelos mortos (ver 2Mc 12.40). Mas os ensinos de Cristo e dos apóstolos nunca incluem proferir orações pelos mortos. O eco à parte, essas duas expressões nada têm em comum.” (1 Coríntios, Ed. Cultura Cristã – p. 686, 690). Para completar as palavras de Kistemaker, o texto de Macabeus não ensina que o povo de Deus ora por mortos, antes que aquelas pessoas foram mortas, por Deus, justamente por práticas religiosas de outros povos, como a própria oração pelos mortos. O autor registra que “sob a túnica de cada morto, encontraram amuletos dos ídolos de Jâmnia, que a Lei proíbe para os judeus” (2Mc 12.39 BP) – ou seja, você está defendendo uma ideia, vinda de alguma religião pagã usando a Bíblia e a Bíblia está te condenando e todos que praticam coisas pagãs da mesma forma. Não há apoio algum a esta prática nas Escrituras e ainda aprendemos com elas que, em breve Deus julgará e condenará ao inferno quem as pratica. É assustador o nível de cegueira espiritual que paira sobre o catolicismo romano ainda hoje.

Paulo à Timóteo

O último texto usado pelo comentarista é 2Tm 1.16. Sobre ele não preciso mais do que algumas palavras, uma vez que Paulo está apenas orando “pela família de Onesíforo” e não pela alma do morto. Porém, cabe aqui um trecho do comentário Histórico Cultural que ajuda a ampliar o que Paulo estava escrevendo:

“É possível que “Onésimo” (Fm 10) seja contração de Onesíforo, mas a pessoa descrita por Paulo aqui não parece ser um escravo recém-liberto. Como Paulo se refere a toda uma “casa” de cristãos, esse Onesíforo talvez tivesse escravos e outros dependentes. “Trouxe ânimo” indica hospitalidade, o que incluiria, naturalmente, abrigar viajantes. A residência de Onesíforo provavelmente era grande e Paulo talvez se alojasse ali sempre que vinha a Éfeso. Onesíforo é um bom exemplo para Timóteo de alguém que “não se envergonha”” (Comentário Histórico-Cultural da Bíblia, Novo Testamento, Ed. Vida Nova).

Portanto, o texto citado pelo autor do comentário a respeito de Sydney Charles Gayford está claramente errado. Paulo não está ensinando a orar por Onesíforo, mas pela família dele. Isso está explícito no texto bíblico, por isso não precisamos tomar mais tempo com esta questão aqui.

Conclusão

Concluímos, portanto, que orar pelos mortos e/ou se batizar em favor daqueles que morreram sem Cristo é pecado! Deve ser rejeitado pelos cristãos e aqueles que praticam tais coisas abomináveis devem ser rejeitados como cristãos. São, portanto, pagãos fingindo ser cristãos. Estas pessoas precisam conhecer a verdade e abandonar o engano, pois, morrendo numa condição assim estarão eternamente perdidas por causa de sua idolatria.
Incluo aqui a oração à Maria e a qualquer pessoa falecida. O mandamento do Senhor condena esta prática de maneira explícita (Êx 20.4,5) quando proíbe criar imagens de veneração para pessoas mortas e se ajoelhar diante delas. A adoração inclui a oração e portanto Deus está proibindo ambas.

Além do óbvio, a Bíblia não ensina orar por mortos em nenhum livro, incluindo aqueles incluídos na Bíblia católica. Isso é um dos motivos mais fortes para abandonar, não apenas esta prática, mas o catolicismo romano.

Espero ter ajudado, peço que Deus conclua o que iniciamos aqui. Amém.
 
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