O liberalismo teológico nasceu no calvinismo?

 O liberalismo teológico nasceu no calvinismo?

Algumas pessoas mal-intencionadas costumam afirmar que o calvinismo foi o berço do liberalismo teológico. Esta afirmação é tão falsa quanto a teologia de quem, geralmente, nos acusa desse grande desastre teológico. A verdade é que o liberalismo teológico surgiu a partir de filosofias que estavam em alta nos séculos XVIII e XIX, como o iluminismo e o humanismo (pensamento muito comum em movimentos católicos e arminianos). É importante pensar um pouco nestes dois posicionamentos filosóficos antes de afirmarmos alguma coisa sobre os calvinistas.
O iluminismo, como pensamento filosófico, enfatizava a importância da razão, da ciência, da liberdade e do pensamento crítico. Isso fez com que as doutrinas pregadas pelo calvinismo fossem desacreditadas, pois, usando a autoridade bíblica, nós afirmamos coisas que para a mente humana parecem ser ilógicas. Doutrinas como a da inerrância bíblica, a eleição e predestinação, e a condenação do homem ao inferno são colocadas contra as paredes racionais mundanas e condenadas pelo iluminismo até hoje. Aliás, vale mencionar que a Bíblia para o mundo não faz o menor sentido, e por isso ela deixou de ser importante, pois sua mensagem claramente vai contra a lógica deste mundo. Não é à toa que hoje em dia os crentes consideram menos a Bíblia do que antes do movimento iluminista; nós, calvinistas, travamos uma batalha longa para trazê-la novamente ao centro do culto cristão.

Outros pensamentos acompanharam o iluminismo e podem ter criado o liberalismo na Europa durante o mesmo período, tais como:

  • Racionalismo: pensamento que valorizava apenas a razão humana e desprezava qualquer coisa que particularmente não fazia sentido. O racionalismo está longe de ser um pensamento filosófico capaz de determinar o que é certo e errado, uma vez que a razão está intimamente ligada à cultura. Logo, um povo que desvaloriza a Palavra de Deus não verá razão alguma para obedecê-la ou considerá-la capaz de ensinar algo sobre Deus. Até hoje, teólogos arminianos usam o racionalismo para lutar contra doutrinas claramente ensinadas na Bíblia, e é possível que este movimento tenha surgido bem antes do iluminismo; os argumentos racionalistas são encontrados na teologia remonstrante, do século XVII.
  • Empirismo: este pensamento enfatiza a observação e a experiência como meios de compreender o mundo. Disso não é difícil perceber como o empirismo influenciou o liberalismo, levando-o a adotar práticas de outras religiões como sagradas, mesmo que estejam distantes da realidade bíblica. Igrejas empiristas constantemente afirmam que "a letra mata, mas o Espírito vivifica", no sentido de desprezar a Palavra de Deus em busca de uma experiência religiosa muitas vezes não apoiada pelas doutrinas bíblicas. Se a Bíblia não é o centro da teologia, então tudo que gera experiência pode ser reconhecido como divino, inclusive aquelas que não são respaldadas pela Bíblia. Dessa maneira, o movimento pentecostal se banhou e ainda serve em copos sujos aos seus membros, que infelizmente vivem sem descobrir o que a Bíblia ensina sobre tais práticas.
Veja bem, como é possível que o liberalismo tenha surgido dentro do calvinismo, se as cinco solas que professamos são completamente contrárias ao que os liberais pensam e ensinam até hoje? E se isso é impossível, por que algumas pessoas que se dizem estudiosas nos condenam por isso? Existem pelo menos duas respostas válidas para isso:
  1. Algumas pessoas saíram do protestantismo para apoiar os pensamentos iluministas e, consequentemente, liberais. No entanto, isso não é estranho, nem novo. Pessoas mudam de posição o tempo todo, e não é incomum que isso ocorra na igreja também. Isso quer dizer que o calvinismo foi o fundador? De forma alguma! Essas pessoas saíram do movimento ou foram excluídas da igreja por isso, logo, elas não representam o protestantismo dentro do liberalismo. E é preciso dizer que essa afirmação é de enorme desonestidade intelectual, a ponto de deixarmos de considerar aqueles estudiosos que fazem esse tipo de afirmação, pois certamente não estão tratando de forma séria o assunto. Ora, será que essas pessoas estão considerando os membros das próprias seitas quando saem de lá e se tornam o oposto do que pensavam? Ou será que estão tão preocupadas com o calvinismo que não percebem que isso acontece?
  2. Desde a Reforma Protestante, pessoas têm militado contra o protestantismo. No início, o catolicismo, posteriormente, o arminianismo. Não é de se estranhar que um arminiano minta e distorça os fatos quando trata das nossas doutrinas. Eles as detestam porque são mais humanistas do que pensam e quando se mostram contra a nossa doutrina, claramente estão rejeitando a autoridade bíblica e usando o racionalismo para determinar o que é certo e errado (o que obviamente é uma péssima decisão).

Antes do iluminismo, havia o humanismo, um pensamento que influenciou fortemente o pensamento anti-calvinista e também é supervalorizado no movimento liberal. Quando tocamos neste assunto, algumas pessoas torcem o nariz e afirmam que muitos reformadores eram humanistas, mas não foi esse pensamento inicial que colaborou com o liberalismo, e sim o seu desenvolvimento.

Se o humanismo coloca o homem no centro de todas as importâncias, e a Bíblia afirma que "todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus", as pessoas que apoiam tal movimento precisam necessariamente reduzir ou até mesmo apagar a importância da Bíblia para a construção de uma teologia que atenda aos seus propósitos. Por isso, precisam militar contra a doutrina da soberania de Deus, contra a eleição e predestinação e, consequentemente, contra a inerrância e autoridade das Escrituras.

O humanismo é o grande deus de muitas igrejas modernas e também do movimento liberal. Dele surgem ideias como o livre arbítrio e a salvação pelo mérito e obras humanas.

Certo pastor, ao tentar ofender o calvinismo, citou Nietzsche como apoio. Veja, quem foi mesmo esse personagem tão importante da história? Não foi ele considerado uma das bestas do Apocalipse? Mas por que um arminiano usaria um pensador assim contra um movimento religioso? Eu poderia usar textos satânicos a fim de deturpar minha própria religião e ainda ser considerado cristão depois disso? Óbvio que não, mas por que estão fazendo isso com ele? Porque as pessoas comuns não sabem o que ele está fazendo, e este é o alvo de pessoas assim, alcançar pessoas comuns e enganá-las.

Veja, como é possível um movimento afirmar a soberania exaustiva de Deus, a sua eleição incondicional e o decreto da condenação ao inferno e a inerrância das Escrituras, ter sido o berço do liberalismo? Essa afirmação não faz o menor sentido! Mas vejam como isso nos leva a um pensamento mais profundo sobre a fé. O grupo religioso que se esbanja dos pensamentos liberais, iluministas e humanistas, nos culpa de ter criado tal movimento. Que tipo de fé essas pessoas professam? Será que a religião, para eles, é realmente importante, ou apenas querem reafirmar os ideais de liberdade e racionalismo do movimento iluminista? Não seria isso uma estratégia dos próprios liberais para fazer com que o único movimento contrário a eles perca a força e assim tenham um inimigo a menos? Se sim, isso estaria dando muito certo. Com o tempo o cristianismo tem perdido suas origens e abraçado, sem perceber, os ideais liberais presentes na teologia arminiana desde o início. As pessoas estão lendo menos a Bíblia, ouvindo menos sermões e agindo cada vez mais de acordo com seu livre arbítrio. Nós estamos lutando para frear esse movimento, mas aparentemente eles estão vencendo.


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